Um anjo e um pregador

Um anjo e um pregador

Eis que na praça central, numa tarde abafada, surge do nada um jovem alto, de vestes simples e escuras, magro e mal barbeado, com um livro em mãos e começa a pregar. Ele começa mansinho, falando baixinho, manso mesmo e sozinho, mas logo está sobre um banco e começa a gritar. O povo que passa no entorno começa a se interessar por aquela fala intensa e num instante, num breve momento ele está vigorosamente a pregar.


E prega o fim do mundo, o fim do homem e dos pássaros. Ele prega sobre pragas, sobre doenças e dores e fala de um mundo repleto de clamores. Prega sobre um Deus irado que quer se vingar, que quer justiça com sangue e que não quer mais nos perdoar.


Prega sobre dias de choro, de tristeza e ranger de dentes e sobre uma gente ardente que vai agonizar. E segue pregando, falando do homem, da cobiça e da fome, da malbaratada política e do demônio que vem em modo de enganação e vai levar o irmão para no inferno queimar.


A dureza das palavras, vai juntando a multidão, que curvada ao peso da dor de tamanha maldição começa a olhar para o chão. No semblante de todos há medo e apreensão, são vidas sofridas que buscavam consolo e de repente é mais dor e nada de perdão.


O jovem pregador grita a plenos pulmões, não se sabe bem a razão de tanta plateia, afinal não diz coisas boas, e nem diz coisas belas. Mas vai juntando o povo, eu diria um povão. E talvez por falar em Deus, quem sabe é recado, afinal aqui e ali tem mesmo muito pecado. Quem sabe se ele vem trazendo o caminho ou a solução. Todos querem saber, todos somos devedores, sempre é bom aprender. Fato é que sobra gente na volta do rapaz, e que barulho, que presença, quanta farra a tristeza faz.


Deus do temor, Deus do terror é só isso que se vê o garoto pregar, todos esperam a contrapartida. O que se faz para o mundo salvar? Em que parte do discurso o Deus generoso vai entrar?


Eis que em meio à multidão vem correndo e desgovernada uma garotinha em pequena bicicleta. Atrapalhada e em disparada lá vem a garotinha a gritar desesperada: ” vamos abram, abram caminho pois estou descontrolada”!


A multidão se afasta, mas não evita a queda e a pobrezinha se estatela no chão, brinquedos e balas voam da bicicleta. Descabelada e com os joelhos ralados a pequena dispara a chorar.


Acabou a pregação, todos querem ajudar. Um consola, outro acalma, num instante estava a pequena no banco do pregador, sendo paparicada pela mesma multidão que outrora parecia obcecada com as mais duras palavras do estranho pregador.


Ela contou em detalhes como perdeu o controle e em meio as lágrimas surge uma gargalhada que acompanhada de todos vira uma grande risada.
E foi assim que Deus que não é vingativo, tirano ou agressor, mandou seu pequeno anjo para esclarecer, que ele é só amor. Seu anjo era um aprendiz com certeza, desajeitado e pequeno, mas cheio de alegria e beleza mostrou que cair funciona com o levantar, que Deus está em todas as mãos que queiram amar e que nesse mundo viemos para nos ajudar.


Não há caminhos definidos e nem definitivos, todos os dias tudo pode mudar, depende do passo, da vontade e da coragem. Deus que é bom o tempo todo, não está no discurso vazio, nos gritos ou na pregação, ele está dentro de nós, lá no fundo do nosso coração.


Acessar esse bom Deus é uma mágica abençoada que se tem que aprender, e parar de procurar fora o que está dentro de você.



Mariângela Carvalheiro
Psicopedagoga e graduanda em Gerontologia

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