Quando se tem em casa um idoso e uma criança pequena, se tem o maravilhoso caos instalado. Por vezes nos parecem duas crianças, e outras vezes dois idosos, impossível definir.
E embora a caminhada os levem para estradas diferentes o convívio pode ser fantástico para ambos. São os pontos de encontro, onde podemos observar a mesma atuação em artistas tão distintos. Vivenciar um período assim ainda que desgastante promove boas risadas e ótimas lembranças.
De repente aquela preocupação com a alimentação da criança, agora é a mesma com a vovó. Você começa a picar frutinhas, fazer papinhas e caldos, gelatinas e vitaminas, pensar em coisas de fácil digestão, comidinha balanceada que tem que ser também colorida e divertida, senão os problemas começam já na mesa.
Fraldas tem tamanhos diferentes, mas a hidratação da pele é fundamental e preocupante. Hora do cochilo, hora do sol e da televisão.
Tem também a hora de contar estórias, em geral é sempre a mesma. Para os meus personagens a estória era de um coelho nervoso, de orelhas tremulantes, chamado Felpo Filva, conhece? Uma gracinha.
Eles gostam de piadas e de gracejos. Elogios tem um efeito e tanto, para melhorar os comportamentos teimosos. E todos os dias brigam, e como brigam! Os motivos são variados, as vezes nem existem. Brigam na divisão dos chocolates, dos biscoitos, contam as balas, querem quantidades idênticas de suco, nunca precisam de banho e nunca, nunca mesmo estão com sono, embora baste minutinhos calados para um sono profundo, com direito a babar no travesseiro.
Assistem os mesmos programas de televisão, riem dos mesmos desenhos, amam fadas e heróis, torcem pelo mocinho, pela mocinha, reclamam do vilão e até choram se as coisas demoram a se resolver na trama. Paciência não é uma característica dessa fase ora distinta, ora idêntica.
Quando finalmente dormem, tem-se que os ver muitas vezes durante a noite, pois não param cobertos. As gripes, as viroses os escolhem o tempo todo, e mal um deles melhora, o outro já começa a espirrar.
É a fase que se amam e se elogiam: “ A vovó é linda e o nenê é lindo”, muita pureza num mundo todo particular. Mas também: “o bebê é chato, a vovó é boba” e demais adjetivos que aprendem rapidinho um com o outro deixando alguns dias mais longos e irritados.
No entanto, o tempo passa e o bebê cresce. Fim das fraldas, as comidas são sólidas, o mundo externo começa a acenar com uma vida social. Tem amiguinhos e compromissos, aniversários, escola e as atividades mudam a rotina da criança agora crescida. E é quando tudo muda.
Já a vovó segue nas fraldas, nas papinhas, o tempo que é generoso para a criança, para ela oferece perdas. Ela não ouve bem, nem enxerga os desenhos, não entende mais as piadas e não quer brincar. O sono é mais constante, o cansaço é intenso, ela está indo embora.
Os peregrinos da mesma caminhada, agora se separam, pois, o trajeto mudou. Que pena, eram dias felizes! Mas que bom, afinal temos que evoluir e novos trajetos são bem-vindos. Crescer é preciso, ou crescer não é preciso?!
Mas o amor não acaba. Nossas experiências, satisfações, sorrisos e vivências ficam gravadas em nós e em nossos amados. Ciclos terminam, mas as sensações estão guardadas em alguma parte. Alguém sempre sobrevive.
A criança vai crescer, passará por muitos ciclos até envelhecer e se tornar aquela velha criança, voltando para as fraldas, para os desenhos animados e canções de ninar, enquanto outra criança crescerá, representando esse ciclo permanente que é a vida.
Mariângela Carvalheiro
Psicopedagoga e graduanda em Gerontologia
mariangelamsc@gmail.com
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