O problema do conhecimento é um dos grandes debates da filosofia. A constante problemática, que há muito vem sendo abordada por diversas escolas filosóficas, supera os limites do ordinário, transcendendo para questões profundas, como a discussão entre razão e crença, relação entre sujeito e objeto e a percepção de realidade e imaginação, dentre outros pontos relevantes para a formação do conhecimento.
Essa sistemática de distinções e percepções a qual o processo de conhecimento está vinculado em uma sociedade, é uma das grandes questões apresentadas, por exemplo, pelo filme Matrix, que engloba as teorias sobre o tema, tanto pelo ponto de vista do entendimento humano e a forma como se dá o conhecimento, quanto pelas relações que determinado conhecimento gera e resulta em todo o processo social.
Matrix ultrapassa os parâmetros “normais” da sociedade de forma a confrontar a realidade, sendo categórico ao afirmar que as sociedades vivem em uma ilusão. Tal pressuposto pode significar que, na realidade, a humanidade está “adormecida” em sua “ignorância” e só conseguirá acordar ao buscar o conhecimento pleno, absoluto. Trata-se de uma metáfora de significativa importância para o contexto atual.
Da mesma forma, a problemática filosófica discutida pelo longa questiona os conceitos pré-formados e o que o homem entende como conhecimento em todos os níveis e em todas as sociedades, desde o extremo oriente até o extremo ocidente e insere, abertamente, premissas que não só exprimem a necessidade em se entender o que é real, como também a importância em se compreender o que pode estar distante disso.
O sujeito do conhecimento é o ser humano. Ele é o único que possui a capacidade de refletir sobre esta relação. Já o objeto não é necessariamente algo concreto. O objeto consiste em tudo aquilo que pretendemos conhecer. São fatos, fenômenos, coisas, o próprio homem, ou seu intelecto como aquilo que conhece, que pode vir a ser objeto, caso seja alvo da investigação.
O filme apresenta uma busca constante do sujeito pelo conhecimento. A verdade, que é oferecida, é exposta na narrativa como um complexo mundo “imaginável e real”, composto por uma sociedade alienada, com instituições corruptas e corporações poderosas, que escravizam e usurpam a sociedade. Assim, o conhecimento verdadeiro nos afastaria da ignorância e da ilusão deste mundo.
Apesar de parecer algo abstrato tal percepção não está longe do que as sociedades atuais viraram e estão vivenciando na prática do mundo moderno. Instituições tornaram-se benevolentes à corrupção, o Estado, enquanto organismo que haveria de ser referência, cultiva práticas decadentes e a alienação tem tornado a sociedade extremamente corrupta e escravizada.

A exploração da relação sujeito e objeto segue em uma certeza explanada na narrativa, quando se assume algo que é necessário conhecer. Existe, entretanto, conflitos entre as premissas e possibilidades deste conhecimento. Há, dessa forma, posições dogmáticas e dogmáticas racionais, onde alguns que englobam o escopo narrativo creem em uma verdade e na possibilidade de conhecê-la, bem como acreditam na capacidade da razão de conhecer as coisas. Assim, os que ainda estão “libertos” da ignorância são capazes de conhecer a suposta verdade, conforme apresentado nas reflexões de Aristóteles e Platão. A Alegoria da Caverna, deste último, onde há a opção para se escolher o caminho da luz e a saída da escuridão é referência clara para se enxergar a verdade, para se alcançar o conhecimento.
Por outro lado, a negação parcial da verdade é a mais previsível das respostas humanas e, dentro do contexto filosófico, expressa um ceticismo relativo, discorrendo em sua linha temporal em determinados momentos da proposta a impossibilidade de alguns domínios do conhecimento. O amplo debate sobre essas questões e os posicionamentos apresentados deixam, assim, implícito um debate sobre “uma verdade universal”.
Partindo uma vez mais dos problemas explanados no longa, Matrix insere abertamente algumas premissas – realidade e ilusão/imaginação – que não só exprimem a necessidade em se entender o que é real, como também a importância em se compreender o que é irreal. “O que é real? Como se define real? Real são apenas impulsos que seu cérebro pode interpretar”, expressa, definindo, assim, os limites da capacidade humana.
Utiliza, ainda, muitos elementos que abarcam a esfera religiosa, os quais podem possuir múltiplos significados religiosos e criar embates filosóficos e científicos. Termos como “Neo”, “escolhido”, “Trinity”, a batalha contra os agentes do mal, escuridão e luz, e a ressurreição para a salvação de todos, reforçam a visão religiosa da figura messiânica, do escolhido. Assim, explora a possibilidade do conhecimento metafísico e, ainda, faz alusão ao cristianismo, onde Cristo é o escolhido. É o mestre. É aquele que transmite a esperança e é quem trará a paz. As referências se expandem às outras religiões onde há um único escolhido, um messias.
A somatória de todas as vertentes ora contextualizadas nos levam a uma singular questão reflexiva sobre as esferas do conhecimento: é possível um conhecimento universal? Se é possível, como os homens podem alcança-lo? Talvez essa seja a mais urgente busca da filosofia, uma vez que a razão inversa dessa ordem já culminou no que os estudiosos já classificaram como a era da pos-verdade
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