O Paradoxo do Navio de Teseu, de Plutarco (Lúcio Méstrio Plutarco, Queroneia, 46 d.C. – Delfos, 120 d.C), se refere a Teseu, uma figura mítica muito conhecida por ter derrotado o Minotauro e que, devido a tal conto, deu início ao referido paradoxo.
O paradoxo do Navio de Teseu conta que em muitas décadas, um navio, o de Teseu, depois de cada viagem, tinha uma ou algumas de suas partes substituídas por novas, devido ao desgaste e a danos acontecidos nas viagens. Depois de tantas décadas, todas as peças haviam sido substituídas.
A pergunta é: o navio, gradativamente modificado, é o mesmo ou outro idêntico que o substituiu? Para tornar mais complexo o paradoxo, as peças que foram retiradas e substituídas, foram guardadas e muito bem preservadas. Com elas, o navio foi remontado, ficando dois navios idênticos. A pergunta fica mais complexa: qual dos dois navios é o original? Qual é o navio de Teseu, que fez parte de todos os seus contos? O navio remontado seria um outro navio?
Tal paradoxo nos leva a reflexões existenciais. Tal como o navio de Teseu, cada um de nós, Seres humanos, está em constante remodelagem interior. Estamos nos reformulando de maneira contínua e constante. Cada parte do nosso todo que modificamos, criamos e recriamos, nos mantêm continuamente sendo quem somos, mas modificados e renovados, nos fazendo diferentes do que éramos, mas sendo quem somos, mas diferentes do que éramos. O que fomos ainda faz parte do que somos e continuará sendo, pois memórias são atemporais e podem nos direcionar a um estado de percepção presente, mesmo que sejam somente memórias e, necessariamente, pertençam ao passado.
Tal como o Navio de Teseu, somos os mesmos, porém, sempre modificados, mesmo que permaneçamos os mesmos. No entanto, as partes alteradas, permanecem muito bem guardadas em nossos porões de memória, algumas partes mais conscientes e outras tão inconscientes, que parecem ter sido esquecidas ou até mesmo destruídas, mas continuam lá.
Tal como o Navio de Teseu, somos um algo, mas que sofreu alterações na nossa jornada, devido aos danos causados por ela, tal como o Navio de Teseu sofreu. Por isso, mesmo sendo um novo alguém a cada momento, ainda podemos ser diversos alguéns constituintes do nosso todo único, podendo nos gerar dúvidas sobre a nossa própria identidade. Por isso, para nós, que não somos meros objetos, mas sim, seres muito bem dotados de pulsões, emoções, sentimentos e razão, não temos como sabermos qual de nós somos, mas sim, que somos tudo; que somos uma frota de nós mesmos, tal como uma frota de navios, mas guiados por um único comandante que deve escolher muito bem as suas estratégias, para que as suas decisões não destruam parte da frota, que implica em destruição de parte do nosso todo.
Somos réplicas de nós mesmos, construídas na jornada existencial de cada um e do Todo e, assim, parecemos ser frota e não um, mas nos tornamos um, quando nos tornamos bons comandantes da frota que somos. Quanto mais navios, mais forte é uma frota, se bem comandada. De igual forma, quanto mais de nós existirem dentro de nós; da nossa história individual, se formos bons comandantes, teremos navios especializados para diversas tarefas.
O paradoxo é sobre um objeto material, mas para o processo de consciência, que é imaterial, tudo se torna um.
Se analisarmos o paradoxo, nenhum navio foi o navio de Teseu em todas as suas jornadas, pois teve partes modificadas e sempre foi navio diverso do da viagem anterior. Cada viagem, um navio, mesmo que pareça ser o mesmo. Quando refeito, era outro, pois as suas peças estavam desgastadas e também não conheceu na íntegra todas as jornadas de Teseu, pois desde a primeira, começou a se modificar. Logo, o navio reconstruído era um outro navio, pois cada parte que nele estava, representando apenas a primeira viagem, reformulou um navio que tinha existido em apenas uma jornada, mas constituído de partes que haviam participado de décadas de jornadas.
Acontece algo semelhante com os Seres humanos. Cada história, cada dano, cada tempestade… nos obriga a mudarmos e, quando buscamos partes nossas que deixamos de usar, mas que ainda residem em nós, as buscamos acopladas a diversas outras partes deixadas nas tantas jornadas que vivemos. Destarte, cada parte que era, também deixou de ser, pois fazem parte de um novo conjunto de partes que eram e de outra, mesmo que fugaz, que é. Cada parte se encaixa às demais e, assim, uma frota se refaz em nós, em cada viagem, na grande viagem do existir.
O que importa em primeiro lugar, não é o navio ou a frota, mas a capacidade do comandante. Capacidade que é necessariamente adquirida e refinada na própria Jornada (vida), em meio as tantas jornadas (situações).