O renomado jurista brasileiro Dalmo Dallari conceitua o Estado enquanto “uma ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em um determinado território” . Nesse sentido, a própria definição de Estado guarda uma relação íntima com a sua função derradeira, qual seja: a promoção do bem comum. Segundo as determinações axiológicas e políticas da Constituição brasileira de 1988, a orientação do Poder Público está atrelada ao processo de consolidação da dignidade da pessoa humana, compreendida enquanto a realização dos direitos e garantias fundamentais. Não obstante, a eminência nevrálgica atribuída aos direitos humanos pela legislação nacional, a conjuntura brasileira expressa um total descaso com os princípios estruturais da justiça social e com os elementos do genuíno constitucionalismo.
Numa primeira análise, é importante destacar e ressaltar o significado do constitucionalismo e dos seus desdobramentos na esfera pública. De acordo com o entendimento majoritário dos juristas, o movimento constitucionalista representa um conjunto de elementos e valores de limitação do poder do Estado em face dos direitos individuais. Sendo assim, trata-se de uma cosmovisão jurídica que compreende a imprescindibilidade da legalidade e dos direitos humanos como instrumentos de atenuação das arbitrariedades estatais. Na contemporaneidade, o constitucionalismo, além do quesito da limitação do poder público, também reitera uma função ativa do Estado na consolidação da dignidade humana e da justiça social, sobretudo, pelo fomento dos direitos sociais, os quais objetivam o mínimo-existencial e o combate às desigualdades socioeconômicas exacerbadas. Infelizmente, a sociedade brasileira está longe de um compromisso sólido com a dimensão valorativa do constitucionalismo.
Desse modo, a busca pelos direitos fundamentais representa um compromisso do Estado democrático e social de Direito. Todavia, a realidade nacional expressa uma impotência da sociedade na realização genuína do espaço público mediante aos preceitos do constitucionalismo e da legalidade. Ademais, a pobreza de grande parcela da população, o corporativismo, a prevalência das vontades particulares na esfera pública, a privatização do poder político e as crescentes desigualdades econômicas tipificam uma conjuntura destoante da orientação normativa da Constituição de 1988, conhecida como Constituição cidadã. Além disso, é notável a descrença do povo em relação ao governo e, até mesmo, em relação às normas constitucionais, consideradas popularmente como utópicas.
Diante dos fatos supracitados, é premente frisar a necessidade dos direitos fundamentais no espaço público. Apesar de representar um trabalho árduo, a promoção dos valores do constitucionalismo é imprescindível para o bem comum e, em última instância, para a tão frisada cidadania. Nas palavras da filósofa alemã Hannah Arendt, “cidadania é o direito a ter direitos”. Portanto, a efetivação da própria cidadania exige um compromisso com os direitos humanos, os quais devem ser compreendidos a partir da legalidade, da dignidade da natureza humana e dos elementos principiológicos do mínimo-existencial.