O último inimigo com o qual o ser humano se depara na vida é a morte, e quando a morte leva uma mãe, o estrago é enorme e dura para sempre.
Nossa alma vivente perde vigor e vontade e uma brecha fica eternamente aberta e alimentada por uma dor que chamamos de vazio.
Lembranças viram consolo, a vontade de reviver certos momentos é permanente e o seu jeito, seu cheiro, seus hábitos são balsamos que eternizam aquela personagem. O tempo abranda daqui e dali essa ausência e os dias reorganizam a vida sem nunca curar realmente aquele coração quebrantado.
Vida que segue e fazemos novas conexões que incluem e excluem pessoas, o ritmo do mundo nos impõe a caminhada e caminhamos sempre apressados, por vezes sem tempo nem para sofrer. Remédio contra a tristeza se encontra no trabalho, na formação, nas rotinas exigentes e na sobrevivência, e como sempre, vida que segue e vida que segue.
Não nos damos conta, no entanto que aquela mãe hoje saudade vive em nós o tempo todo, não nos damos conta que temos manias e trejeitos idênticos, que usamos seus velhos ditados, que aquele jeito brejeiro que a fazia tão única hoje também nos representa. Os pais são nossos modelos mentais e aquele bocado de conceitos éticos, valores e critérios que forjam nossa personalidade foram aprendidos desde o berço, na convivência que nasce na fragilidade da infância. Esses seres adoráveis, nossos anjos da guarda eternos que pareciam já serem memórias e retratos começam a se tornar presentes quando a idade começa a ficar avançada. Saudades e lembranças começam a gritar suas presenças, e numa distração da mente já envelhecida, começamos a chamar pela mãe. Tenho visto diariamente isso acontecer nas casas geriátricas e em especial com as mulheres. Muito comum a inquietação no final da tarde, onde as idosas esperam a chegada das mães, comentam sobre a comida que só a mãe sabe fazer, o bolo, a roupa que a mãe comprou e os passeios que ainda vão fazer. “Mamãe! ”assim dizem elas. Pelo menos uma vez por dia a mamãe é a personagem viva e ativa no repertório de dezenas de velhinhas. Quem ousar explicar-lhes a realidade, certamente nem será ouvido. Demência, Alzheimer dirá o racional, mas eu chamo de saudades!
A terceira idade é um retorno a infância e o personagem mais significativo da primeira infância é a mãe, assim se tudo vai mudando e voltamos até para as fraldas, como não solicitar que a heroína da infância retorne também? E a “mamãe” como elas dizem, sempre tão presente na infância, com seus carinhos e amor, retorna para dar folego de vida para essa fase mais frágil que traz o envelhecer.
Feliz de quem teve uma mãe amorosa e fraterna, enérgica ou brigona para ser lembrada e chamada no entardecer, feliz de quem pode usar essa artimanha, mesmo que pareça um brincar de faz de conta. O valor de uma mãe é mesmo inestimável. E quando todas as certezas vão embora, só mesmo chamando a mamãe.
Mariângela Carvalheiro
Psicopedagoga e graduanda em Gerontologia
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