Dizem que o útero é uma casa pequena, aquecida, as vezes confortável e outras não. Há sensações de êxtase e de medos, sombras e ruídos que desafiam a imaginação do bebê. Numa boa gestação é casa feliz, numa gestação difícil é esconderijo de temores. A posição fetal é uma posição protetora e de acolhimento, refúgio para a passagem do tempo.
O universo trabalha sempre em nosso favor e busca equilíbrio e superação de momentos difíceis, ele nos oferece soluções possíveis para cada momento e por vezes nos limita ao essencial, mas tudo demanda tempo, o tempo de maturação e quando estamos prontos, aí pronto, nascemos! E esse nascimento é diário, nascemos a cada manhã para cada uma de nossas experiências.
Eis que começa a época de aquisições e aprendizagens. E vamos colecionando aprendizagens, conhecimentos, informações, capacitações e protagonismo. Vamos aprendendo a ganhar e perder, aprendendo negociações e lamentos, conexões, limites e sentido. Nada nos passa despercebido.
Evoluímos. E num mundo de evolução não se pode ter uma vida perfeita. O sobe e desce do tempo transforma aspirações em recordações e num dado momento parece hora de voltar ao útero, aquela casa pequena, aquecida e acolhedora. Não escolhemos o tempo dessa viagem de retorno, mas é um desligar de luzes que acontece paulatinamente.
Um dia a visão começa a diminuir, franzimos a testa para olhar, os detalhes vão se perdendo, o colorido é substituído por sombras, sombras que substituem a nitidez. Depois a audição. Há ruídos e chiados. O paladar muda drasticamente, tudo precisa ser macio e líquido. Os movimentos ficam lentos, as juntas são doloridas, o corpo pesa muito, há sono, cansaço e preguiça. Adota-se uma boa e velha poltrona para estacionar toda dor. Olhos mais fechados, cochilos grandes, perguntas sem respostas.
O coração passa a bater descompassado e a respiração se torna um pouco incomoda. Mas a mente encontra nova morada e lá permanece, buscando conforto no próprio silencio. Talvez no silencio haja muito barulho, lembranças e sensações, memórias e histórias, mas aqui de fora não se ouve nada.
A poltrona já não serve mais, o corpo pede cama e logo está enroladinho como na posição fetal. Vez por outra um sorriso ou um lamento. E o tempo se encarrega de fazer o resto, tudo vai parando e a boa alma para, voltando para casa, para o útero.
Para muitos a morte é o fim, mas para outros apenas um esconderijo da alma que deve seguir evoluindo de outra forma e em outro lugar. A morte é parte da vida, e se viver é um privilégio, morrer é uma necessidade. Fica a história, o legado, o amor espalhado, o amor recolhido. Os exemplos deixados, os toques e os perfumes.
Caem as folhas, segue a árvore. E o universo que trabalha para o equilíbrio. Reorganiza, harmoniza e pacifica tudo outra vez.
Mariângela Carvalheiro
Psicopedagoga, Graduanda em Gerontologia
mariangelamsc@gmail.com
Leia nossa indicação e post “É possível chegar a perfeição do ser humano?”
Siga nosso insta @PensarBemViverBem