Passar fofocas adiante seria uma versão retrô e analógica do hábito digital contemporâneo de compartilhar fake news e outros gêneros da desinformação?
As próximas linhas trazem pensamentos existentes e cenários verídicos para refletirmos sobre o complexo ato de fofocar.
Começando pelo livro “TRATADO GERAL SOBRE A FOFOCA: UMA ANÁLISE DA DESCONFIANÇA HUMANA”, publicado por José Ângelo Gaiarsa, no ano de 1978:
Todos sabem que é assim, mas nenhum autor sério ousa tratar do assunto. Muitos cientistas experimentarão um arrepio pelo corpo e uma sensação imediata de ridículo só em pensar em uma tese de sociologia sobre fofoca. Sentem medo de que seu trabalho se faça objeto de fofoca de seus confrades. Ninguém se deteve ainda sobre esse curioso processo: a fofoca, o mais fundamental dos fenômenos humanos, acontece de tal forma que se esconde na medida em que aparece. Quase ninguém diz ou sequer reconhece que faz fofoca. Ninguém faz — mas ela existe muito. É isso.
José Ângelo Gaiarsa
Você concorda com a citação acima? Trata-se de uma passagem marcante da análise sociológica, filosófica, histórica e psicológica que o autor fez da fofoca. Aliás, cabe destacar aqui uma dupla de camadas na base de tal abordagem:
1) “Rir e se coçar”, fofocar e projetar: é só começar!
Fazendo fofoca sobre alguém, damos um jeito de colocar no alvo de nosso falatório aqueles preconceitos guardados em nosso interior. A sensação imediata é de liberdade.
Ilusoriamente livres de quaisquer defeitos, meio que nos realizamos com uma autoimagem nada realística, pela qual somos sempre os modelos de perfeição.
2) Ninguém se ilude impunemente…
Prejudicar o próximo, a depender de quem assume a conduta fofoqueira, tanto faz como tanto fez.
Todavia, Gaiarsa reitera que, ter ou não ter crises de consciência pela destrutividade de nossos atos não é tudo: fofocando, frustramos 100% das nossas chances de aprendizado e autodesenvolvimento, ponto que faz da fofoca um indiscutível tiro no pé.
Fora da brincadeira coletiva infantil do telefone sem fio, cabe às gerações adultas levar em conta a seriedade de atuar como uma referência responsável para a população infanto-juvenil.
Rever como agimos perante as informações que recebemos corresponde a um compromisso prioritário.
Sem banalizarmos as dimensões dos impactos coletivos, exercícios de autocrítica nos deslocam do mero papel de indivíduos, envoltos em dramas e fragilidades pessoais, para uma coerente participação cidadã.
Professores e professoras que não nasceram e cresceram imersos na web que o digam!
Docentes procuram se unir com profissionais da Comunicação para romperem múltiplas barreiras e bloqueios, abraçando técnicas, tecnologias e métodos em nome de um relacionamento seguro e proveitoso com a alta carga de informações disponível.
Diariamente, mestres e mestras testemunham algo que Daniela Machado, coordenadora do EducaMídia, programa de Educação Midiática formador de docentes e produtor de conteúdo sobre o tema, resumiu bem:
O melhor e o pior da internet estão a um clique do nosso alcance. No caso das crianças e dos adolescentes estamos cometendo uma enorme falha quando evitamos tratar desse assunto e outros assuntos do universo digital.
Daniela Machado
Os tempos de Pandemia da COVID-19 seguem evidenciando os tempos digitais e chacoalhando fortemente toda a humanidade.
Por incrível que pareça, parte expressiva do povo brasileiro com acesso à internet insiste em compartilhar conteúdos duvidosos, tal como se espalha conversa fiada em ambientes físicos: sem conferir as fontes e a autoria dos mesmos, ignorando a gravidade da repercussão de mentiras e compactuando com inúmeros crimes.
Num balaio só, misturam-se fatos e boatos, confundem-se discursos de ódio com opiniões, violações são classificadas como livres expressões e por aí vai.
Desde o comecinho da fila dos compartilhamentos virtuais ou não, em qual fluxo navegará tanta gente que normaliza “brincar” com coisa séria?
E aquele cochicho “sem maldade”, aquele descontextualizado e descompromissado repasse de segunda mão, com confidências ao pé do ouvido de colegas, trocas de olhares sarcásticos e insinuações irônicas, no canto da sala, sem provas e sem testemunhas?
Será que esses velhos equívocos se distinguem tanto assim das curtidas, comentários, das notícias falsas, memes ofensivos e da proliferação de ações criminosas por detrás das telas?
Certos engajamentos, seja na fila do pão, seja numa rede social ou onde for, podem sim acabar alterando drasticamente os rumos da vida alheia.
Já pensou que, de ouvido em ouvido, de boca em boca e de clique em clique, as fofocas e boatos contam contos e aumentam pontos distorcidos na história da própria humanidade?
Em Rompendo as bolhas da polarização, Patrícia Blanco, presidente do Instituto Palavra Aberta, entidade líder do EducaMídia, escreve e exemplifica a problemática ora tratada:
Sarampo, difteria, rubéola, poliomielite, caxumba e coqueluche. Erradicadas pelas campanhas de vacinação, essas e outras doenças ameaçam voltar em várias regiões do globo por causa dos movimentos antivacina que vivem de espalhar mentiras nas redes sociais e em aplicativos de mensagens. As mentiras compartilhadas aos borbotões por mal-intencionados e desavisados circulam como se fossem verdadeiras e ameaçam também o controle da pandemia de Covid-19.
Patrícia Blanco
No perfil @educamidia, consta inclusive o breve lembrete a seguir:
Em um ambiente democrático, é preciso saber ouvir, opinar com responsabilidade e, com isso, estabelecer, desde as discordâncias, o consenso.
Patrícia Blanco
Falando em discordâncias, 2020 e 2021 trouxeram as comemorações de dois centenários, respectivamente: o do psiquiatra brasileiro José Ângelo Gaiarsa e o do educador Paulo Freire. Brasileiros, nascidos nas décadas iniciais do século passado, ambos nos deixaram legados provocativos, questionadores e visionários.
Abrir diálogos e reflexões que saem de zonas de conforto culturais promove a geração de temas polêmicos, problematizações e posicionamentos tão admirados quanto repudiados em rodas de conversa.
Pioneiros no país, um em práticas terapêuticas e o outro em práticas pedagógicas, os dois pensadores ora relembrados costruíram obras envolvidas em controvérsias e críticas nas esferas da Educação, da família, da sociedade, da sexualidade, dos relacionamentos e da Saúde.
Leituras do mundo e saberes discordantes de noções autoritariamente tratadas como máximas e verdades absolutas funcionam como contrapontos.
Destacando a natureza dialógica entre modos de pensar plurais como característica da democracia, no estudo O CORPO NAS RELAÇÕES RACIAIS: SUBJETIVIDADE NA INTERRELAÇÃO ENTRE NEGROS E BRANCOS, realizado pela pesquisadora Maria Cristina Francisco, fragmentos dos livros PEDAGOGIA DO OPRIMIDO, de Freire, e de O OLHAR, escrito por Gaiarsa, compõem as bases que trazem à tona outro fenômeno-teste para as nossas relações democráticas:
É um desafio denunciar o racismo, pois muitos não desejam essa mudança, tentam desqualificar a realidade do escravismo colonial e a ditadura em nossa constituição, considerando “mimimi”, assunto desagradável e não querendo o enfrentamento de si mesmos.
Maria Cristina Francisco
Logo em seguida, ela cita Gaiarsa:
Basta desviar o olhar (daquilo que incomoda) ou desfocar o olhar (‘olhar distante’). Esse fato explica a negação (…). Creio que ele tem demais a ver com a repressão em geral. A repressão consiste em não olhar para aquilo que eu queria, devia ou gostaria de olhar. Fora ou dentro de mim. Consiste em não dar atenção ao que está atraindo minha atenção, em agir como se não percebesse aquilo que é importante para mim – porque eu ‘não devo’, ou no momento não me convém, olhar para lá, para aquilo, para aquela.
José Ângelo Gaiarsa
Estudar e ler Filosofia são atividades que proporcionam o desenvolvimento de habilidades socioemocionais, porque nos aproximam de realidades e valores socioculturais contidos em registros, épocas e territórios que nem sempre convergem com as narrativas, enfoques e horizontes familiares para nós.
Não cabe às reflexões filosóficas mirarem e atirarem ódios nos conceitos estudados ou nos sujeitos componentes das ideias refletidas.
Em “Rompendo as bolhas da polarização: o ambiente tóxico gerado pela desinformação e pelo radicalismo inibe a liberdade de expressão”, Patrícia Blanco escreve um alerta a respeito dos ruídos impulsionados por emoções e manipulações que se emaranham na teia das intolerâncias aos raciocínios que divergem de inflexíveis padrões:
O ambiente tóxico gerado pela desinformação e pela prática do discurso de ódio inibe a pluralidade dos debates e a liberdade de expressão. Na prática, sem a garantia de diálogo construtivo e diante da virulência das bolhas sociais, pessoas até então dispostas a colaborar com o debate público decidem não participar para se preservarem, em uma atitude muito semelhante à autocensura. (…) É hora de virar esse jogo, e a mudança começa com mais educação, tanto nos bancos escolares quanto fora deles.
Patrícia Blanco
Somos aprendentes em experiências que não se limitam aos espaços e aos anos da escola, uma vez que a aprendizagem colabora com o nosso crescimento durante a vida toda.
Patrono da Educação brasileira, restrito em liberdade de expressão, Paulo Freire cumpriu exílio político no período da ditadura militar. Pelo que gostava de chamar de “andarilhagens”, esse pernambucano influenciou intelectualmente as comunidades por onde andou e participou de diálogos.
As lutas antirracistas que derrubaram a segregação do Apartheid, sistema em vigor na África do Sul até 1998, comprovam esse acontecimento. Em reportagem de Daniel Giovanaz para o Brasil de Fato, o coordenador do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social, Richard Pithouse ressaltou a contribuição Paulofreireana que, após transformações, permanece forte em terras sul africanas:
(…) no seu compromisso com a intersubjetividade, ao propor um ‘encontro político’ baseado no reconhecimento mútuo das personalidades dos indivíduos, ele (Paulo Freire) dialogou e se encaixou perfeitamente com vários ‘modos africanos’ de compreensão do mundo.
Richard Pithouse
Engana-se quem pensa que Paulo Freire se limitou a registrar apenas as afinidades que tinha com a ‘compreensão de mundo’ africana.
Era 1994 quando, numa palestra proferida no auditório do CDCC, com o patrocínio do IFSC-USP e da Escola Educativa, o premiado educador realizou um relato em forma de confissão. De maneira bem-humorada, câmeras registraram a ocasião em que relatou o desconforto por ele sentido, no momento em que caminhava e conversava com um professor.
Corajosamente, diante da plateia, Freire confessou a força de sua angústia e preocupação com o que seus conterrâneos diriam se o vissem de mãos dadas com seu interlocutor, naquele passeio pelos jardins de uma Universidade na Tanzânia.
Pego de surpresa pela mão, ele conta que se sentiu desesperado em tal circunstância que nada sugeria de vexatório ou passível de homofobia na cultura do país onde estava. As seguintes passagens selecionadas de sua fala transcrita, oferecem-nos uma aula sobre a importância de nos permitirmos a autocríticas, não desperdiçando aprendizados por embarcarmos na autocensura, na omissão, na negação ou na reprodução velada de violências:
(…) eu quero fazer uma declaração pública, quer dizer… indiscutivelmente, a minha reação era uma reação machista, uma reação discriminatória… e eu quero dizer a vocês que eu evoluí muito, entende? (…) respeito profundamente os outros. E quero agora fazer a crítica de mim mesmo. Mas a crítica de mim mesmo é a crítica à minha cultura (…).
Paulo Freire
Retomando o que Gaiarsa denominou no livro referido como “medo de ser fofocado”:
Todos sabem que a fofoca está aí, todo mundo faz parte dela, todo mundo morre e vive por ela, mas todos dizem que fofoca é uma tolice. O principal fator que modela a vida das pessoas — o medo de ser fofocado (como dizem) — “é uma bobagem”, “é divertido”, “ora, não tem importância nenhuma”, “não é uma coisa séria”… A fofoca é claramente uma rede pública secreta! Não sei de nenhum outro fato social ou psicológico do qual se possa dizer a mesma coisa.
José Ângelo Gaiarsa
Vencer a tentação de retroceder na hora de refletir acerca dos constrangimentos e falhas pessoais: na contramão das polarizações e fundamentalismos, a lição de Paulo Freire sintoniza com uma mensagem de Natália Mazotte. Nas palavras da coordenadora do Insper, se a “desinformação sempre irá circular, é preciso que haja informação boa circulando ao mesmo tempo para fazer frente a esse desafio”.
É indispensável que nos esforcemos para não silenciarmos nossas potencialidades, ponderando criticamente e com respeito, ao invés de, imediata e impulsivamente, reagirmos e nos engajarmos em contextos sociais desgastados e injustos.
O próprio Gaiarsa testemunhou os percursos obscuros da Ciência durante as guerras mundiais e suas marcas: narrativas construídas e mercantilizadas para autorizar o racismo, o machismo, o capacitismo, a homofobia, a xenofobia e outros ódios traduzidos em rótulos de “doença mental”, ódios distribuídos por sujeitos defensores de ideologias tóxicas e interesses escusos.
Posicionamentos como o de Gaiarsa agradam e desagradam muita gente. Contudo, são fundamentais para separarmos o joio do trigo. Ora, se a presença científica tem os seus pontos benéficos, cabe a nós a ponderação para, diria o antigo ditado, “não jogarmos o bebê fora junto com a água da bacia”!
Confira algumas lacunas históricas expostas pelo escritor e psiquiatra infanto-juvenil Sami Timimi em seu livro MEDICINA INSANA, cujos capítulos foram publicados de forma seriada pelo site Mad in Brasil:
Marcas da escravatura e do colonialismo no desenvolvimento do campo da Psiquiatria
Cérebros menores?
No final do século XIX, era uma crença aceita que os membros das raças “africanas” tinham cérebros menores, bem como um instinto mais natural para o trabalho físico, e eram psicologicamente primitivos em comparação com os membros da raça “europeia”.
Sami Timimi
Drapetomania?
A “Drapetomania” foi o diagnóstico utilizado para o suposto transtorno mental que levava os africanos a fugir do cativeiro de escravos. Os líderes do movimento dos direitos civis e manifestantes nas décadas de 1950 e 1960 foram frequentemente rotulados como mentalmente transtornados devido à sua suposta reação “patológica” enquanto desarmonia emocional, hostilidade e agressão.
Sami Timimi
Eugenia, racismo, sexismo, capacitismo e outras tendências presentes em concepções psiquiátricas
Inferioridade hereditária?
O psiquiatra alemão Emil Kraepelin (1858-1926), considerado o pai da psiquiatria biológica, cujo sistema de categorização das apresentações psiquiátricas é ainda hoje a base dos sistemas de diagnóstico utilizados, era um ardente eugenista e racista. (…) Ele argumentou que o efeito de grande número de “idiotas, epilépticos, psicopatas, criminosos, prostitutas, e vagabundos” que descendem de pais alcoólicos e sifilíticos, e que transferem a sua inferioridade para os seus descendentes, era incalculável.
Sami Timimi
Violações legalmente autorizadas?
Rüdin esteve envolvido na introdução nazi da “Lei para a Prevenção da Descendência com Doenças Hereditárias” de 1933, que permitiu a esterilização forçada de uma série de pessoas, incluindo aquelas com um diagnóstico de esquizofrenia ou maníaco-depressão. Esta lei abriu o caminho para que os psiquiatras acabassem por se envolver no episódio mais vergonhoso da sua história – o extermínio sistemático dos seus pacientes.
Sami Timimi
Políticas, planos e princípios nazis?
Os psiquiatras da era nazi foram defensores instrumentais e frequentemente entusiastas da instituição de um sistema de identificação, notificação, transporte e morte de dezenas, possivelmente centenas, de milhares de doentes mentais e de indivíduos “racialmente” ou “cognitivamente” comprometidos em ambientes que vão desde hospitais psiquiátricos centralizados, a prisões e campos de morte. O papel deles foi fundamental para o sucesso da política, planos e princípios nazis.
Sami Timimi
Patologização da homossexualidade, transtornos mentais e desigualdades sociais?
A homossexualidade foi um transtorno mental até 1973, quando por uma pequena margem de votos foi retirada do Manual de Diagnóstico Estatístico Americano (DSM). Das 17.910 pessoas elegíveis para votar nessa decisão, a votação foi de 32% a favor da retirada do DSM, 21% contra, e 47% sem voto. A prevalência de transtornos psiquiátricos também mostra uma relação inversa com a classe social. Além disso, quanto maior for o nível de desigualdade em qualquer sociedade, maior será a prevalência de transtornos mentais. Ainda nem sequer comecei a falar do gênero.
Sami Timimi
Apenas em 2019, finalmente a transexualidade deixou de constar como um transtorno mental no Manual de Diagnóstico.
Merecem igualmente longos e esclarecedores parágrafos, as críticas às violências mediadas por sistemas de Saúde Mental e demais setores envolvidos na patologização de corpos femininos.
Sob paradigmas indecorosos, como forma de opressão e imposição de poder, manipuladoramente, inúmeras mulheres foram e continuam a ser rotuladas pela Psiquiatria.
Tal estratégia capacitista instrumentaliza e reforça a psicofobia (preconceito contra pessoas com deficiência ou em sofrimento mental) para pôr em cheque a lucidez das vozes femininas que ousam denunciar abusos, rompendo com os jugos da cultura do estupro e tantas outras agressões sexistas.
Até quando feridas e desarmonias coletivas seguirão sendo distorcidas em desequilíbrios/doenças individuais?
Não só os conceitos utilizados na psiquiatria são institucionalmente racistas, mas também, através do processo de “psicologização”, problemas que são sócio-políticos convertem-se em problemas psicológicos. As consequências devastadoras do racismo e da discriminação, juntamente com as desigualdades persistentes e generalizadas na sociedade, são transformadas em transtornos mentais que necessitam de “cuidados de saúde mental” em vez de ação política.
Sami Timimi
Em seu livro A FAMÍLIA DE QUE SE FALA E A FAMÍLIA DE QUE SE SOFRE 8ªED. (2005), Gaiarsa se expôs à revolta de grupos que cantam e decantam concepções idealizadas e incongruentes com as práticas dos núcleos familiares, propondo críticas e reposicionamentos em torno, sobretudo, das pressões às quais as crianças são expostas em meio aos conflitos parentais.
Alegando que, na qualidade de primeira instituição na qual convivemos, a família ‘está, deveras, muito longe de ser o melhor lugar do mundo para o desenvolvimento dos seres humanos’, o médico contribuiu com estímulos para que não “cancelemos” conversas que precisam ser encaradas.
A boa notícia é que, se há mais de 40 anos atrás um tratado sobre a fofoca era motivo de estranhamento por parte da comunidade científica, de 2007 a 2010, últimos anos de vida de Gaiarsa, Martinho Braga Batista e Silva, do Instituto de Medicina Social (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), aprofundou-se na atmosfera fofoqueira por meio do artigo DE PACIENTE A CAUSO: UMA ETNOGRAGIA COM EGRESSOS DE INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA.
Entre boatos, fofocas, calúnias, difamações, pós-verdades, casos, causos e causas, sobrenomes e apelidos, necessitadas de promoção de Saúde, pessoas se deparam com equipes antiéticas e convivas multiplicadores de velhas indignidades que oprimem.
Os limites das resiliências se rompem e os ciclos de múltiplas violências se reafirmam cada vez mais robustos.
Distorções comunitárias, comportamentos manicomiais e necropolíticas tendem a corroer os direitos humanos de quem, no enfrentamento das injustiças sociais, ao colocar em exercício a própria cidadania e recorrer às coletividades, flagra-se tratado (a) (e) como objeto de escárnio e de desqualificação.
Por que alta qualidade educacional mais ações educativas para lidar com as mídias e concreta liberdade de imprensa, cenários de países como a Finlândia e a Holanda, mudam os rumos das prosas distorcidas em uma sociedade?
De que maneiras gente melhor informada e mais resistente a crer em mentiras, boatos e a alimentar fofocas acaba resistindo mais a abordar indicadores de desequilíbrios políticos e sociais como sintomas de desequilíbrios de corpos individuais?
Como o compromisso coletivo e individual com a responsabilidade no trato das informações e na socialização dos conhecimentos age na dissolução de barreiras físicas, atitudinais, comunicacionais, nominativas etc., viabilizando suportes apropriados e prevenindo violências?
Qual a relação entre a qualidade da escuta/comunicação entre sujeitos sociais e a confiança nas instituições públicas que zelam pela sociedade?
Preconceitos, crenças, mitos e estereótipos ignorados são ameaças imensas à liberdade e à integridade de seres humanos não raro expostos, histórica e longamente, à dores de origem ético-política (violências, fome, miséria, exclusão, abusos…).
Espremendo toda a realidade dentro da bolha das doenças mentais, se abordagens e discursos biomédicos persistem como modelos explicativos dominantes, com seus ranços de colonialidade e suas pedras nos caminhos burocráticos para restringir acessos, a despatologização da vida corresponde a um tópico que carece de ser expandido sem rapapés.
Fica aqui o convite para que você compartilhe as presentes reflexões e leituras de mundo no seu círculo de amizades e colegas, com os nossos agradecimentos por sua leitura atenciosa…
Até o próximo encontro, erguendo as nossas taças cheias de discernimento, proponho que façamos um brinde ao que podem as aberturas de diálogos, mentes e corações cultivados por uma Educação libertadora: SAÚDE!