A virtude da humildade

A virtude da humildade

“A perfeição da humildade é o conhecimento da Verdade”, dizia São Bernardo de Claraval, grande Doutor da Igreja. Em meio a tantas falhas  e derrotas na vida espiritual, percebo o valor inalienável e inestimável desta tão querida virtude, cuja amplitude valorativa abarca quase toda a complexidade da espiritualidade prática. Compreender nossas limitações e aprender a se contrariar são práticas imprescindíveis para uma real comunhão com Deus.

Nesse sentido, aqueles que não conhecem a si próprios estão fadados ao fracasso e aos limites impostos pelo obscurantismo da ignorância. Destarte, o autoconhecimento é uma condição imprescindível para a contemplação da Verdade.  Por certo, o reconhecimento das próprias falhas é sempre uma tarefa árdua, pois há em nós a tendência da vanglória e do orgulho, cujas práticas nos privam da magnanimidade e da caridade, já que a renúncia da vontade própria é necessária para o conhecimento verdadeiro. Na maioria das vezes, a verdade está além de nossas opiniões particulares. Dessa forma, para contemplá-la, o intelecto e a razão precisam reconhecer que existem inúmeras coisas que as superam, conforme diria o filósofo Blaise Pascal.

Ademais, aqueles que se afastam dos preceitos da genuína humildade manifestam sinais de uma cólera implacável, cujo traço distintivo é a ira. Sendo assim, o desumilde se apega com tanto fervor aos seus desejos e opiniões que demonstra uma incapacidade profunda de aceitar, com resignação, as correções oriundas do próximo e as ideias contrárias aos desígnios de sua vontade. Portanto, o orgulhoso é incapaz de conviver em meio aos ideais antagônicos e diversos, pois não consegue aceitar quando é contrariado.

Diante do exposto, muitos mestres da teologia espiritual eram categóricos na afirmação segundo a qual é impossível mortificar a ira sem antes mortificar o orgulho. Inquestionavelmente, há no orgulho um autoengano notável, pois o apego ao próprio “eu” afasta o indivíduo de suas relações sociais mais próximas. Dessa forma, o indivíduo se afasta de sua família e de seus amigos verdadeiros, mas não percebe a própria culpa e busca, de forma incessante, refúgio em seus devaneios de vanglória. Consequentemente, a insegurança nasce e a incapacidade de suportar, com estabilidade emocional, as inconstâncias e adversidades passa a sufocar todo indício de mansidão. Destarte, os orgulhosos são impacientes e dominados pela irritabilidade e inquietação.

Em virtude dos fatos mencionados, percebe-se que a irritabilidade oriunda da autoafirmação própria é um grande empecilho para o progresso no conhecimento genuíno. À visto disso, o filósofo estoico Epiteto costumava dizer que manter a mente em comunhão com a verdade é algo excludente da preocupação exacerbada com as coisas que estão além de nosso controle. Eis um dos fundamentos da humildade e da apologia da paciência.

Por fim, percebe-se o valor inestimável da humildade. Com ela, crescemos na piedade prática, na esperança, na paciência e, sobretudo, na sinceridade. Sem a sinceridade, o homem é incapaz de construir amizades autênticas e relações sociais sólidas, mas, primordialmente, torna-se inapto para a comunhão com o Criador. Nesse sentido, frisava o teólogo Stephen Charnock: “Podemos muito bem dizer que adoramos a Deus, ainda que não sejamos perfeitos. Porém, não podemos dizer que O adoramos se nos falta sinceridade”. 

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